Senti-o respirar e acordei.
Não estava habituada a ter alguém a dormir comigo, incomodava-me ter de partilhar o espaço de uma cama de solteira, não gostava das lutas pelos cobertores, entrava em pânico com o acordar a dois e especialmente com aquelas palavras lamechas, ditas no meio de um pequeno-almoço que dava certamente para alimentar um família, pela abundância e variedade de comida. Talvez fosse por isso que eu não gostasse de dormir acompanhada. Gostava de pequenos-almoços simples, café e torradas, e o dia corria-me muito melhor.
Tentei não me mexer com medo de o acordar. Não saberia o que dizer. A nossa relação de poucas semanas não me havia preparado para esta primeira e repentina dormida juntos. Era sempre assim, tudo muito precipitado. Não conseguia contar as relações que tinha tido nesse último ano e os meus amigos já se riam quando eu dizia que estava mesmo apaixonada e que desta é que era. Apesar de tudo, eu acreditava no que dizia, mas logo se revelavam os primeiros defeitos, brotavam as primeiras discussões ao mesmo compasso que aparecia um novo alguém na minha vida, ainda envolto na cortina do mistério, com o charme natural do desconhecido. Era então um novo começar numa relação que eu achava que ía ser a "tal" e o fim de outra que eu tinha apelidado outrora do mesmo modo. E eu acreditava mesmo no que dizia. (Mas sentia?)
Não me sentia culpada pela velocidade avassaladora a que consumia os sentimentos. Os meus e os dos outros. "Que culpa tenho eu se deixo de gostar? Nunca enganei ninguém" mentia para mim própria. A traição era um pecado que me podiam apontar. Por vezes a celeridade da nova paixão não dava tempo de findar a anterior e envolvia-me em jogos sujos de engano e de mentira. "Era apenas mau timing" sorria irónicamente. Abstraí-me nestes pensamentos até que adormeci no leito da minha própria ilusão.
Voltei a acordar com o mexer do seu corpo. O dia já ameaçava nascer e conseguia então observar-lo. O tronco nu, os seus braços fortes, a pele morena. Fixo-me no seu rosto. Está sereno, dorme profundamente e consigo adivinhar pelo suave sorriso que esboça que viajava num sonho bom. Nunca lhe tinha topado esta expressão. A vivacidade que emana, os risos sonoros, a gesticulação exacerbada, toda essa extroversão escondiam esta calma que também é sua. Graciosidade e beleza tomavam conta de mim. Sinto-me então bem ao seu lado, como nunca me sentira com ninguém. Seria por me entregar constantemente à loucura da luxúria sem tirar partido de momentos como estes?
Mexo-me calmamente, com medo de o acordar e interromper o único momento que valera a pena na noite. Aconchego-me no seu peito, e beijo o seu rosto. Agarra-me a mão. "Bolas! Estragaste tudo!" pensei. Nesse segundo rodou o seu corpo para mim e olhou-me nos olhos. Sorriu do mesmo modo que sorria no sono, enquanto encostou os lábios ao meu ouvido e me murmurou versos de Neruda. Ri alto. Um riso feliz, desconcertante. Fixou-me novamente e perdemo-nos os dois numa viagem de sentidos. A minha pele queimava em contacto com a sua. Olhava-o extasiada enquanto me tocava com exagerada calma "Quero muito mais do que me estás a dar. Quero que a tua alma seja minha" Tantas vezes já tinha ouvido palavras como estas, mas nesse dia fizeram, pela primeira vez, sentido. Queria que esse corpo que me queimava acordasse ao meu lado todos os dias. Queria que esse sorriso que me enlouquecia me acordasse todas as manhãs. Rolámos para o chão, e amámo-nos ao som do amanhecer de um novo dia....
O dia em que descobri o prazer da monogamia.
Interpol - No I In Threesome
11/01/09
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